IMIGRAÇÃO CHINESA NO BRASIL - Antes dos Japoneses

    

A cidade carioca serviu como porta de entrada para os primeiros imigrantes chineses, que chegaram ao Brasil no século XIX para introduzir a cultura do chá e, com o passar do tempo, passaram a se dedicar ao comércio


Por SHU CHANG-SHENG


     Quando se pensa em imigração de chineses no Brasil, o primeiro lugar que vem à cabeça é a cidade de São Paulo, onde vive a maior colônia chinesa do País. No entanto, foi o Rio de Janeiro, capital brasileira até 1960, que serviu como porta de entrada para esses imigrantes no Brasil. Por ter abrigado a Corte Portuguesa e o início do governo republicano, o território carioca e seu porto foram lugares-chave para os primeiros contatos dos chineses com as terras brasileiras. Comparativamente, apesar de a quantidade desses imigrantes que se estabeleceu no Rio de Janeiro não ter sido tão grande como em São Paulo, suas experiências foram pioneiras, ganhando um sentido referencial para o que seria realizado em outras regiões do Brasil. Além do mais, o Rio de Janeiro foi a primeira cidade brasileira a receber imigrantes chineses no século XIX.


PLANTAÇÃO DE CHÁ, JOHANN MORITZ RUGENDAS
Na década de 1810, os primeiros chineses chegaram ao Rio de Janeiro para introduzir a cultura do chá no Brasil. A ilustração do pintor alemão Johann Moritz Rugendas (1802-1858) registrou a plantação chinesa de chá na região do Jardim Botânico


     É difícil dimensionar a presença do povo chinês no Brasil devido a problemas de declaração de nacionalidade e imigração irregular. O Consulado Geral da China no Rio de Janeiro calcula que atualmente há 150 mil pessoas no Brasil entre chineses, chineses naturalizados e descendentes - sete mil no Rio de Janeiro, 140 mil no Estado de São Paulo e três mil em Curitiba. Mas outras estimativas chegam a contar uma população em torno de 250 mil, com cerca de dez mil residentes no Rio de Janeiro. Os levantamentos indicam também a capital paulista como o grande centro chinês, com cerca de 90% dessa população. Rio de Janeiro e Curitiba viriam na seqüência do ranking populacional.


     No Brasil, assim como no mundo inteiro, a maior parte dos imigrantes chineses tem origem nas três províncias marítimas no sul da China: Guangdong (i.e., Cantão), Fujian e Taiwan. Há muitos séculos, os cantoneses e fujianeses atravessavam os mares para exportar a porcelana, a seda e o chá para a Índia e o mundo árabe (de onde os produtos chineses chegariam à Europa). Ao longo do tempo, assentaram-se no Sudeste da Ásia para fugir das guerras e da falta de alimentos que assolavam o território chinês. Desde o final do século XVIII, os cantoneses e fujianeses já emigravam para a América do Sul (mais especificamente para Cuba e Peru), por meio do tráfico dos coolies (trabalhadores).

OS CULTIVADORES DE CHÁ DO SÉCULO XIX


     Os chineses foram os primeiros imigrantes estrangeiros que chegaram ao Brasil no século XIX para trabalhar na agricultura. De fato, o interesse pela mão-de-obra da China já podia ser observado em 1808, quando o Conde de Linhares - título que na época pertencia ao militar Domingos de Sousa Coutinho (1755-1812) - chegou a cogitar a hipótese de trazer dois milhões de chineses como uma maneira de contornar a proibição do tráfico negreiro, que foi imposta pelos ingleses. Uma colônia de chineses foi trazida de Macau para o Rio de Janeiro pelo Governo Real Português, entre 1812 e 1819, de maneira a introduzir a cultura do chá no Brasil. Tratava-se de um projeto econômico estratégico, organizado pelo governo de Dom João VI, estimulado pelo Ministro do Reino, Conde de Linhares - nesse período, o posto era representado por Francisco de Sousa Coutinho Teixeira de Andrade Barbosa (1790-1857), - e protegido pelo Ministro de Guerra e dos Estrangeiros, Conde da Barca - António de Araújo e Azevedo (1754-1817).



COLEÇÃO PARTICULAR


     O plano foi instituído em 1810 e, dois anos depois, chegaram ao Rio cerca de 300 chineses, além de mudas e sementes de chá vindas de Macau no navio Vulcano. Eram plantadores de ervas da província de Hubei, local famoso pelo chá verde, que foram colocados para trabalhar na fazenda da família imperial, no Rio de Janeiro (que mais tarde veio a ser o Jardim Botânico Real). Em 10 de setembro de 1814, desembarcaram no Porto do Rio quatro chineses cultos (provavelmente mestres do processamento de chá) que foram morar na residência do Conde da Barca. O pintor alemão Johann Moritz Rugendas (1802-1858), durante sua primeira viagem ao Brasil, entre 1821 e 1825, documentou a plantação chinesa de chá no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, publicando a gravura em seu livro Viagem pitoresca através do Brasil, cujo texto faz referência a uma colônia de 300 chineses na cidade.

REPRODUÇÃO
António de Araújo e Azevedo (1754-1817), o Conde da Barca, ajudou Dom João VI com seu plano econômico estratégico de trazer uma colônia de chineses de Macau para o Rio de Janeiro, entre 1812 e 1819
   Apesar da boa vontade de ambas as partes, o cultivo de chá pelos chineses foi, de modo geral, considerado um fracasso. Por um lado, o diretor do Jardim Botânico tratava os trabalhadores de forma severa, suspeitando de que eles, propositalmente, mantivessem segredos sobre suas técnicas mais sofisticadas de processamento do chá - o que não era verdade, pois os chineses geralmente bebem chá verde e simplesmente não conheciam os gostos euro-brasileiros, que preferiam tomar o chá preto adoçado com açúcar. Por outro lado, os próprios chineses não aceitaram de forma passiva as condições de servidão dentro da fazenda imperial. Quando dois deles fugiram do Jardim Botânico, o filho de D. João VI caçou-os com cavalos e cães. Muitos outros escaparam em seguida, estabelecendo-se em outros locais da cidade, onde passaram a trabalhar como vendedores ambulantes e cozinheiros. Por volta de 1825, vários chineses registrados com nomes brasileiros já tinham adquirido licença para mascatear. Com o passar do tempo, os plantadores de chá tornaram-se mascates, vendendo nas ruas peixes e pastéis. E por que muitos chineses se tornaram pasteleiros? Era um tipo de comércio que exigia pouco capital e permitia ao vendedor trabalhar sozinho. Coisa relativamente fácil para os que não têm dinheiro e nem falam o idioma da terra.
     Em 1881, o Brasil assinou um tratado amplo de "amizade, comércio e navegação" com a China, que proibiu a contratação de mão-de-obra (coolies), visto que os brasileiros proprietários de terras tratariam os trabalhadores como escravos e não como colonos livres. Mas apesar da proibição oficial da China, devido à falta da mão-de-obra, conseqüente da proibição do tráfico negreiro, atividades ilegais do contrabando de coolies receberam apoio do governo brasileiro. Em 1882, foi fundada no Rio de Janeiro a Companhia de Comércio e Imigração Chinesa (CCIC), contando com o apoio ativo do governo brasileiro e visando trazer ao País 21 mil trabalhadores. O primeiro grupo de mil chineses foi enviado pela CCIC a Minas Gerais para trabalhar na Companhia Mineradora de São João d'El-Rey, de propriedade britânica, dona da maior mina da América do Sul, a de Morro Velho. Esse grupo confirmou os piores temores do governo chinês: mais da metade deles recusou-se a pôr os pés na mina, e os que aceitaram, fugiram pouco tempo depois.

A possibilidade de emigração seduzia os jovens chineses esfomeados e descrentes das áreas rurais assoladas pelas crises sociais e econômicas

     O historiador brasileiro José Roberto Teixeira Leite realizou uma pesquisa nos quatro volumes do Registro dos estrangeiros, publicados a partir de 1960, pelo Arquivo Nacional. O autor notou que os chineses possuiam nomes cristãos e apenas quatro dentre eles tinham conservado seus nomes nacionais - justamente os quatro mestres de processamento de chá, registrados em 1814. Uma explicação para esses fatos é que os proprietários das minas e os fazendeiros impuseram nomes portugueses e cristãos aos coolies, da mesma forma que fizeram com escravos negros. Isso pode ser comprovado pelo fato de que nenhum escravo negro no Brasil conservou seu nome original africano.

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     A Imigração chinesa não é difundida como a dos japoneses. E por conta da obrigatoriedade da mudança de nome e sobre-nome, a maioria dos descendentes dos chineses, daquela época, não sabem de suas raízes, pois muitos fizeram questão de deixar para trás suas antigas identidades, pois vieram para cá como "mão de obra farta e barata". 
      O racismo velado vitimou também esta etnia pelas propagandas da Câmara de Comércio Mundial era chamado de "o homem doente da Ásia", embora saibamos, hoje, que é  um povo muito mais encantador do que imaginamos. Sua cultura milenar nos trouxeram grandes avanços que vai  da Matemática a Medicina. 
     De repente você, que está lendo estas linhas, tem antepassados chineses e nem sabe disso. 
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  Em 1919, quando surgiu o Centro Social Chinês do Brasil, os imigrantes já eram donos de restaurantes, lavanderias e bazares
     Por muito tempo, o tibao permaneceu como a principal atividade dos recém-chegados imigrantes qingtianeses, por possuir algumas vantagens: tratava-se de um pequeno comércio, fácil para se começar, e apresentava flexibilidade total em relação ao espaço e ao tempo. Aos poucos, os ambulantes juntaram dinheiro das vendas de toalhas bordadas e montaram pensões e restaurantes. Os primeiros qingtianeses donos de restaurantes foram Chu Zee-Ming, Ye Chio-Ming e Chiu Jen-Fong. Em 1925, os três entraram em sociedade e abriram um restaurante-pensão, na Rua Barão de Mesquita, na Tijuca. Por volta de 1930, Chu Zee-Ming abriu o restaurante "Fong- Shing", na Rua da Conceição, n° 57, no centro de Niterói. O negócio prosperou e tornou-se o maior restaurante dos qingtianeses. Em 1932, Ye Chio-Ming abriu um restaurante na Rua do México, nº 44, e Chiu Jen-Fong montou outro na Praça República.


Comentários

  1. Muito boa essa postagem... até pouco tempo pensava que os japoneses foram os primeiros asiáticos a chegarem no Brasil, mas vi que me enganei bonito hahaha xD

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